quinta-feira, 26 de junho de 2008

Economia

Maior consumo facilita reajuste de preços no setor de serviços

Melhoria da renda per capita dos brasilienses aumenta as vendas e pressiona a inflação

// por Beatriz Vilela e Thaís Rohrer

Em um momento em que o valor de alguns mantimentos está em alta em todo o mundo, o brasiliense está pagando mais caro para comer fora de casa. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que, entre janeiro e maio deste ano, o reajuste no preço dos alimentos no Distrito Federal ficou em 5,21%. Esse aumento supera o acumulado em todo o primeiro semestre de 2007, que ficou em 3,41%, conforme registrado no item alimentação fora do domicílio do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).

Ao mesmo tempo, a renda média do brasiliense também tem aumentado: se em 2006 o rendimento médio das pessoas ocupadas no DF era de R$ 1.484, no ano passado subiu para R$ 1.568, de acordo com dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE).

Newton Ferreira da Silva Marques, analista do Banco Central e professor de economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e da UnB, avalia que a elevada renda per capita de Brasília, proporcionada pelo aumento do poder de compra - como os reajustes salariais - pode provocar esses movimentos de aceitação ou ratificação dos preços altos. Essa situação gera, também, maior acesso ao crédito.

Alexandre Cordeiro, 32 anos, sabe bem o que é isso. Ele trabalha com transporte escolar desde 1998 e comenta que demorou dois anos para reajustar o valor da mensalidade. "Em 2006 e 2007 eu não aumentei o preço, mas este ano subi R$10,00 para compensar os outros anos e a alta do diesel", justifica. O motorista comenta que a demanda pelo serviço aumentou. "A passagem de ônibus está cara, por isso as pessoas preferem a comodidade do escolar, já que a diferença não é gritante", analisa.

Mesmo com o aumento nas mensalidades, Alexandre está ganhando cada vez mais passageiros: em 2008 foram 15 a mais que no ano passado. Um deles é o universitário Ricardo Correia, 25 anos, que costumava utilizar o transporte público para ir à faculdade. “Desde que comecei a fazer estágio, contratei o escolar", diz o estudante. Ele mora com a mãe, Eliete, que é funcionária pública e não pode pagar pelo serviço. Além disso, depois que começou a trabalhar, Ricardo passou a ir mais ao cinema. "Sempre que posso, vou. Quando não trabalhava era mais difícil ter dinheiro para o lazer", conta.

O professor da UnB Roberto B. Piscitelli explica que, quando a economia cresce, o setor de serviços aumenta sua participação no Produto Interno Bruto (PIB). “Do mesmo modo, com o aumento da renda e o processo de urbanização, os serviços se diversificam e sofisticam, devendo-se salientar ainda que as atividades se tornam mais especializadas. É, enfim, o setor que cresce mais rapidamente; a cada dia, ‘inventa-se’ uma nova necessidade”, diz.

Por outro lado, a tendência dos prestadores de serviços - ou, pelo menos, de muitos deles ou de alguns setores - é repassar os aumentos de seus custos, em grande parte, pelas altas mais recentes na alimentação, nos combustíveis, por exemplo. Além disso, se aumenta a demanda pelo serviço, o que ocorre quando a renda está em expansão, a possibilidade de reajuste de preço é maior.

Alexandre B. Bastos, 42 anos, é comerciante e proprietário do restaurante Chão Tropeiro, na Vicente Pires. Para ele, foi um peso no orçamento o reajuste do valor de alguns alimentos. "O feijão, o arroz e o tomate subiram de preço e por causa disso tivemos que repassar o aumento para o cliente", argumenta.

O consumidor sentiu no bolso. Josué Andrade, 27 anos, é costureiro e tem o hábito de almoçar fora de casa aos domingos. Ele reclama do preço da refeição: "Meu salário não mudou. O dinheiro que eu ganho não acompanha a alta de determinados preços. A diferença no almoço chega até R$ 10,00 a mais", protesta.

Apesar da queda da inflação no setor aluguel e taxas, que em junho de 2007 era de 4,63% e passou para 3,42% em maio deste ano, a locatária de uma quitinete em Taguatinga teve que apertar as contas mensais - devido ao aumento na prestação do serviço. Há dois anos, a estudante Mariana Marcolino Junqueira, 24 anos, veio de Caldas Novas (GO) para estudar no Distrito Federal. Ela mora em um imóvel de apenas um quarto, sala, cozinha e banheiro no centro da cidade, e paga aluguel. Quando foi renovar o contrato do local, no início deste ano, teve uma surpresa: uma alta de 14,28 %. "Minha renda não aumentou, na verdade a dos meus pais que me sustentam aqui. E o dono do imóvel não deu nenhuma justificativa plausível", reflete Mariana.

A reportagem analisou a evolução da inflação de seis serviços que afetam diretamente a população: aluguel e taxas, alimentação fora do domicílio, plano de saúde, transporte escolar, cinema e condomínio (ver tabela abaixo). Segundo Newton Marques, a importância desses serviços na economia do DF é muito grande, pois aqui é uma cidade essencialmente ligada ao setor público, que é o de serviços. “Os mais afetados são sempre os das classes mais baixas (C, D e E), pois a parcela dessas atividades é grande na renda deles”, argumenta.


Variação na inflação de serviços em Brasília (acumulada no ano), medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA):

Serviço

Junho/2007

Maio/2008

Aluguel e Taxas

4,63%

3,42%

Plano de Saúde

4,9%

2,68%

Cinema

1,85%

0,3%

Transporte Escolar

3,75%

3,21%

Alimentação fora do domicílio

3,41%

5,21%

Condomínio

10,91%

0,92%

Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).